Em meados da década de 1990, após a legalização dos bingos por meio da chamada Lei Zico, fui contratado por um arquiteto envolvido na montagem de casas de bingo para investigar por que um grupo de engenheiros, responsáveis pelo projeto eletrônico e pelo software do sistema, não conseguia fazer seu próprio projeto funcionar.
Aceitei o desafio e passei alguns dias infiltrado na equipe,
sem que soubessem do meu real objetivo ou das minhas habilidades. Após cerca de
15 dias, consegui identificar os problemas do projeto. Fui então oficialmente
contratado para resolver a situação, e todos os engenheiros anteriores foram
dispensados.
Na época, existia apenas um protótipo funcional, mas com
funcionamento instável. Como já havia clientes com instalações em reforma para
receber os equipamentos, não havia tempo para iniciar um novo projeto do zero.
A solução mais viável foi “remendar” o projeto existente para que funcionasse
minimamente bem.
Para quem não conhece, por trás de uma instalação comercial
de bingo havia uma mesa de controle da extração, equipada com computador,
monitores para câmeras, sistema de som, impressora, controlador de painéis e
da bingueira (o equipamento onde as bolinhas eram sorteadas).
Esses equipamentos eram operados manualmente, os painéis, a bingueira e
as câmeras, todos acionados por chaves físicas.
No computador, havia um banco de dados e um software de
controle. O banco de dados continha o layout de todas as cartelas já impressas
em papel e numeradas.
A comunicação entre a mesa e os painéis, bem como com
a bingueira, era feita através de placas com várias interfaces
paralelas conectadas a cabos telefônicos múltiplos do tipo KS, um cabo para
cada painel e para a bingueira. As distâncias chegavam a
ultrapassar 30 metros. Imagine só: sinais TTL viajando por todo esse caminho!
No final (ou melhor, no começo) dessa história, consegui
modificar o hardware e fazê-lo funcionar, mais ou menos.
A primeira instalação
A primeira instalação aconteceu em uma casa montada em um
antigo cinema desativado na cidade de Araraquara, interior de São Paulo. Após
muito trabalho para instalar tudo — incluindo cinco painéis com displays de
sete segmentos feitos com lâmpadas incandescentes (não existiam displays de LED
grandes para o projeto), instalados a cinco metros de altura, começamos os primeiros testes de extração.
Já na véspera da inauguração, percebi que a tabela do banco
de dados não coincidia com as cartelas já impressas pela gráfica. Como não
havia tempo hábil para uma nova impressão, a única alternativa foi alterar o
banco de dados. O problema é que o programador estava em São Paulo, e ainda não
existia internet por lá.
Tive que abrir três caixas de cartelas, anotar manualmente a
disposição dos números de cada uma delas em um arquivo de texto e passei a
madrugada inteira acordado fazendo esse trabalho.
Na manhã seguinte, improvisei a logística: coloquei o
arquivo em um disquete, paguei um motorista de ônibus para levá-lo até São
Paulo. O programador buscou o disquete na rodoviária, corrigiu o banco de
dados, gravou em outro disquete e me enviou de volta, também de ônibus.
Quando o disquete chegou a Araraquara, faltavam poucas horas
para a inauguração. Por muita sorte, tudo funcionou.
Depois disso, ainda instalei mais três casas com esse mesmo
hardware, até que comecei um novo projeto, com software feito em Visual Basic e
hardware mais enxuto, moderno, e de operação automatizada, utilizando
comunicação serial via RS-485.
Infelizmente, não tenho documentos nem fotos dessa empreitada,
apenas um exemplar do teclado de membrana que seria utilizado nesse novo
projeto. Abaixo um exemplo de casa de bingo da época e o exemplar, que tenho
ainda hoje, do teclado do novo projeto.
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