15 setembro 2025

O Projeto Ciranda e o encanto do CP-500 da Prológica

 


Quem viveu os anos 80 sabe: computador era sinônimo de futuro. Só de ouvir a palavra “microinformática” já batia um frio na barriga, como se estivéssemos prestes a entrar em um mundo novo. E foi nesse clima de descobertas que surgiu o Projeto Ciranda da Telesp.

A ideia era simples e, ao mesmo tempo, revolucionária: levar computadores para as escolas e mostrar às crianças que aquelas máquinas misteriosas poderiam ser grandes aliadas no aprendizado. De repente, salas que antes só tinham giz, quadro e cadernos passaram a ter algo totalmente diferente — uma fileira de máquinas barulhentas, com telas que piscavam em verde e preto, esperando para serem exploradas.

E no centro dessa revolução estava ele: o CP-500 da Prológica.
Um orgulho nacional. Um microcomputador fabricado no Brasil, compatível com o TRS-80, mas com sotaque brasileiro. Quem estudou em uma dessas salas sabe o impacto que era ligar o CP-500, esperar o barulho do drive de disquete ou do gravador de fita, e ver na tela o prompt do BASIC piscando, como se dissesse: “Estou pronto. O que você quer criar hoje?”

Para muitos, aquele foi o primeiro contato com programação.
Quantas vezes não digitamos linhas e mais linhas de 10 PRINT “OLA” / 20 GOTO 10, só para encher a tela de palavras repetidas? Parecia mágica. O computador obedecia a gente. Era como conversar com uma inteligência diferente, mas obediente e paciente.

O Projeto Ciranda foi mais do que aulas de informática: foi a primeira chance de sonhar com um futuro digital. Muitos dos profissionais de hoje, que trabalham com tecnologia, deram os primeiros passos em uma dessas salas. O Ciranda mostrou que computadores não eram apenas para empresas ou para poucos privilegiados — eram para todos, até para crianças de escola pública.

O CP-500, com sua carcaça robusta e seu jeitão sério, acabou virando símbolo de uma época em que o Brasil acreditava que podia criar sua própria tecnologia. Ele estava lá, presente em escolas, cursos, clubes e centros comunitários, ajudando a escrever a história de toda uma geração.

Hoje, olhar para trás dá uma pontinha de saudade. Daquele tempo em que cada comando digitado era uma descoberta. Em que computadores eram raros, mas cheios de possibilidades. E em que projetos como o Ciranda mostravam que, sim, o futuro poderia ser inventado aqui mesmo, no Brasil, com um teclado, uma tela verde e muita curiosidade.

 No Projeto Ciranda, a experiência começava já na chegada ao laboratório. O aluno sentava diante do CP-500, um computador que parecia coisa de outro planeta. Para “entrar” no Ciranda, não havia internet como hoje — a conexão era com o próprio sistema da Telesp, feito por meio de terminais e linhas telefônicas dedicadas, que ligavam as escolas e centros comunitários aos servidores centrais.

Era comum ouvir o barulho característico dos modems discando ou ver os técnicos cuidando da linha para garantir que o sinal estivesse estável. Muitas vezes, o acesso era feito por meio de um terminal CP-500 rodando BASIC, que se conectava ao sistema da Telesp. Ali, os alunos podiam explorar programas educativos, jogos de lógica, exercícios de português e matemática, tudo rodando em rede.

Para quem usava, parecia pura mágica: digitar alguns comandos, ouvir o chiado da conexão pela linha telefônica e, de repente, estar “dentro” do Ciranda. Era como abrir uma porta invisível para um mundo de conhecimento que não estava gravado no disquete da escola, mas sim em um sistema remoto, compartilhado por várias unidades.

Essa forma de conexão foi um dos maiores diferenciais do Ciranda. Não era apenas um curso de informática: era uma rede de aprendizado, interligando escolas, professores e estudantes. Para muitos, foi o primeiro contato com a ideia de “estar conectado”, algo que décadas depois se tornaria rotina com a internet.


Revista Micro Sistemas (junho/82) 





10 setembro 2025

Memórias de Fábrica: Tocadiscos Gallileu e o Fascínio pelos Technics

 Em 1978 e 1979, trabalhei na NIKO do Brasil, em São Paulo. A empresa, de origem argentina, era responsável por importar para o Brasil os tocadiscos Gallileu, fabricados na Argentina. Esses tocadiscos eram parte integrante dos famosos aparelhos 3 em 1 National SS8000, muito populares na época.


Tocadiscos Gallileu ( Imagem da Internet )

National SS8000 ( Imagem da Internet )

National, marca pertencente à japonesa Matsushita Electric Industrial Co., tinha sua fábrica instalada em São José dos Campos – SP. Além da linha National, a unidade também produzia no Brasil os lendários equipamentos da marca Technics, objetos de desejo de muitos apaixonados por som

Lendario Technics SL-1200 MK2, lançado em 1979 ( imagem da Internet )

Amplificador intergrado Technics SU-7300, do final da década de 70 (  Imagem da Internet


Na NIKO, meu trabalho era consertar os tocadiscos Gallileu que chegavam com defeito na linha de montagem. Eventualmente, eu também viajava até a fábrica da National, em São José dos Campos, para corrigir problemas diretamente na produção da Matsushita. Eram dias puxados: havia semanas em que eu consertava mais de 500 aparelhos. A prática intensa acabou me fazendo decorar de memória o código de todas as peças mecânicas desses tocadiscos.

E, confesso, cada vez que entrava na linha de produção da Matsushita, eu ficava simplesmente encantado com os equipamentos Technics. Era impossível não admirar aquelas máquinas que, para mim, representavam o que havia de mais avançado e sofisticado no mundo do áudio.


06 setembro 2025

Baby Boomers e computadores no Brasil



Se você nasceu entre 1946 e 1964, parabéns: você faz parte da geração Baby Boomer. No Brasil, esses anos foram de crescimento, industrialização e… muita curiosidade pelo que o futuro traria. Mas uma coisa era certa: quando nós,  eramos jovens, computador era coisa de ficção científica.

Quando os computadores chegaram

Nos anos 60 e 70, os computadores começaram a aparecer no Brasil, mas não eram aqueles laptops bonitinhos que a gente mexe hoje. Estamos falando de gigantes que ocupavam salas inteiras e precisavam de técnicos para ligar. A maioria dos Boomers olhava aquilo e pensava: “Isso nunca vai entrar no meu dia a dia.”

Anos 80: os microcomputadores chegam




Eu no laboratório da Revista Nova Eletrônica em 1979

Aí vieram os microcomputadores, Apple II, TRS-80, IBM PC. Eles eram mais “amigáveis”, mas ainda caríssimos. Quem tinha um na empresa ou na universidade era considerado quase um mago da tecnologia.

Para os Boomers, o computador não era brinquedo: era trabalho sério. Planilhas, processadores de texto e sistemas internos eram desafios enormes. Muitos precisaram aprender na marra, e algumas histórias dão até vontade de rir:

  • Digitando à mão cartas de clientes porque “o computador travou de novo”.
  • Gastando horas para salvar um arquivo em floppy disk de 8 ou  5 ¼ polegadas.
  • Chamando o técnico de informática toda vez que o computador fazia barulhos estranhos, tipo “bip… bip… bip”… e você tinha certeza que ele ia explodir.

A ponte entre o analógico e o digital

Apesar de toda dificuldade, os Boomers foram a ponte entre o mundo analógico e digital. Eles viram de tudo: da máquina de escrever ao Windows, passando por planilhas gigantes que pareciam mais quebra-cabeças.

Aprender a mexer em computadores foi, para muitos, uma questão de sobrevivência profissional  e de orgulho: quem dominava a máquina na empresa, ganhava status instantâneo.


Minha filha cunhado e sobrinhos na principal atração da sala, nos anos 90

Resumo

Os Boomers brasileiros foram pioneiros da informática sem nem sonhar que isso ia dominar nossas vidas. Eles foram os primeiros a ensinar “como mexer nesse bicho” para colegas e filhos, criando a ponte entre o mundo de papel e o mundo informatizado.


04 setembro 2025

Projeto e instalação de casas de Bingo nos anos 90

 

Teclado de membrana da mesa de controle (tenho o protótipo até hoje)

Em meados da década de 1990, após a legalização dos bingos por meio da chamada Lei Zico, fui contratado por um arquiteto envolvido na montagem de casas de bingo para investigar por que um grupo de engenheiros, responsáveis pelo projeto eletrônico e pelo software do sistema, não conseguia fazer seu próprio projeto funcionar.

Aceitei o desafio e passei alguns dias infiltrado na equipe, sem que soubessem do meu real objetivo ou das minhas habilidades. Após cerca de 15 dias, consegui identificar os problemas do projeto. Fui então oficialmente contratado para resolver a situação, e todos os engenheiros anteriores foram dispensados.

Na época, existia apenas um protótipo funcional, mas com funcionamento instável. Como já havia clientes com instalações em reforma para receber os equipamentos, não havia tempo para iniciar um novo projeto do zero. A solução mais viável foi “remendar” o projeto existente para que funcionasse minimamente bem.

Para quem não conhece, por trás de uma instalação comercial de bingo havia uma mesa de controle da extração, equipada com computador, monitores para câmeras, sistema de som, impressora, controlador de painéis e da bingueira (o equipamento onde as bolinhas eram sorteadas). Esses equipamentos eram operados manualmente, os painéis, a bingueira e as câmeras, todos acionados por chaves físicas.

No computador, havia um banco de dados e um software de controle. O banco de dados continha o layout de todas as cartelas já impressas em papel e numeradas.

A comunicação entre a mesa e os painéis, bem como com a bingueira, era feita através de placas com várias interfaces paralelas conectadas a cabos telefônicos múltiplos do tipo KS, um cabo para cada painel e para a bingueira. As distâncias chegavam a ultrapassar 30 metros. Imagine só: sinais TTL viajando por todo esse caminho!

No final (ou melhor, no começo) dessa história, consegui modificar o hardware e fazê-lo funcionar, mais ou menos.

A primeira instalação

A primeira instalação aconteceu em uma casa montada em um antigo cinema desativado na cidade de Araraquara, interior de São Paulo. Após muito trabalho para instalar tudo — incluindo cinco painéis com displays de sete segmentos feitos com lâmpadas incandescentes (não existiam displays de LED grandes para o projeto), instalados a cinco metros de altura,  começamos os primeiros testes de extração.

Já na véspera da inauguração, percebi que a tabela do banco de dados não coincidia com as cartelas já impressas pela gráfica. Como não havia tempo hábil para uma nova impressão, a única alternativa foi alterar o banco de dados. O problema é que o programador estava em São Paulo, e ainda não existia internet por lá.

Tive que abrir três caixas de cartelas, anotar manualmente a disposição dos números de cada uma delas em um arquivo de texto e passei a madrugada inteira acordado fazendo esse trabalho.

Na manhã seguinte, improvisei a logística: coloquei o arquivo em um disquete, paguei um motorista de ônibus para levá-lo até São Paulo. O programador buscou o disquete na rodoviária, corrigiu o banco de dados, gravou em outro disquete e me enviou de volta, também de ônibus.

Quando o disquete chegou a Araraquara, faltavam poucas horas para a inauguração. Por muita sorte, tudo funcionou.

Depois disso, ainda instalei mais três casas com esse mesmo hardware, até que comecei um novo projeto, com software feito em Visual Basic e hardware mais enxuto, moderno, e de operação automatizada, utilizando comunicação serial via RS-485.

Infelizmente, não tenho documentos nem fotos dessa empreitada, apenas um exemplar do teclado de membrana que seria utilizado nesse novo projeto. Abaixo um exemplo de casa de bingo da época e o exemplar, que tenho ainda hoje, do teclado do novo projeto.


Casa de Bingo nos anos 90 (imagem da internet)


Retro Terminal: Nostalgia com Tecnologia Moderna

 

Inspirado nos clássicos terminais VT100 da Digital, decidi dar vida a um projeto que unisse nostalgia e tecnologia: o terminal NANICO com visual retrô. Tudo começou depois de construir meus próprios computadores Altair 8800 NANICOS, e a ideia de criar um terminal personalizado logo ganhou forma.

Link do Altair 8800 NANICO:  https://erl4ever.blogspot.com/2025/04/computador-altari-8800-na-versao-nanico.html





Terminal VT100 da Digital de 1978

O primeiro protótipo combinava um Raspberry Pi com um monitor LCD de 9" na proporção 4:3, recriando a sensação dos terminais antigos. Já o segundo exemplar, feito sob encomenda para uso como console de jogos retro, adotou um monitor de 7" no formato 16:9, mais compacto, moderno e fácil de encontrar no mercado.

Comparação entre as duas versões




Graças ao Raspberry Pi, o terminal NANICO não é apenas bonito, mas também extremamente versátil. É possível usá-lo para diversos fins: basta trocar o cartão SD e rodar qualquer software compatível com o Pi. Essa flexibilidade abre um mundo de possibilidades para entusiastas de tecnologia, programação e até jogos retrô.

E não para por aí: o terminal vem equipado com um teclado mecânico gamer com iluminação programável, que pode ser destacado do gabinete, oferecendo conforto e praticidade para longas sessões de uso. Uma combinação perfeita entre design retrô e funcionalidades modernas, capaz de encantar qualquer fã de tecnologia clássica.